Pessoas com Doenças Raras merecem morrer: relatos de caso no Brasil
Você deve estar achando que enlouqueci com o título desse artigo.
BRASILEIROS COM DOENÇAS RARAS MERECEM MORRER!
Esse grito da morte que ronda e preocupa famílias de pessoas com doenças raras não é meu, ele vem do governo, justiça e outros órgãos responsáveis.
Seria série de terror, se não fosse tão real, grave e sério o que estamos vivendo em nosso país!
Talvez você esteja entendendo muito pouco sobre o que eu quero dizer. Mas, entenda o seguinte:
Você descobre que tem uma doença grave, pouco conhecida e é das poucas que possui um único tratamento que melhora muito o prognóstico da doença. O medicamento é muito caro e você busca seus direitos por via judicial. Notícia boa: Deferido!
Começa a receber o tratamento e sua vida parece voltar ao normal. Meses ou anos depois, Pá! Mesmo com laudo e prescrição médica, você perde o direito do tratamento.
É assim, que centenas de pessoas ficaram sem tratamento nos últimos meses. Foi dessa forma, que muitas foram a óbito.
O que isso significa?
Você custa muito $$$ pra viver!
Com a interrupção do tratamento, vidas lutam contra o tempo. Sem o tratamento, é fato a instalação de limitações físicas, emocionais e sociais em decorrência da doença.
Vale lembrar o que diz a Constituição Federal, Art. 196:
A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Dia 10/10/2018, o Profissão Repórter abordou muito bem a aflição de quem vive esse dilema. Assista:
A seguir, relatarei três casos de descasos à VIDA em nosso país.
- CASO MARGARETH PÉROLA, BELO HORIZONTE (MG)
Em fevereiro/2018, o caso da Margareth Pérola, 45 anos, teve repercussão nacional. A história foi contada pela sua irmã Ruth Mendes na reportagem acima.
Sua morte aconteceu apenas um mês depois de uma conversa que tive com Margareth sobre projetos para 2019, em Belo Horizonte (MG). O seu maior desejo era que Minas Gerais tivesse conhecimento sobre doenças graves e raras para diminuir o sofrimento dessas pessoas. Fazíamos parte da mesma equipe de voluntários da Associação dos Familiares, Amigos e Portadores de Doenças Graves (AFAG).
Ela não está mais presente fisicamente, mas está em nossos corações e é o que me motiva a escrever, reforçar e reescrever sobre o tema. Ela sempre fez isso, não só por ela, mas por todos Raros do Brasil.
HPN (Hemoglobinúria Paroxística Noturna) era a doença de Margareth. É rara e afeta as células do sangue, acarretando em consequências graves em todo organismo (Leia o post onde expliquei sobre a doença "Aposto que muita gente aqui nunca precisou de um medicamento para viver").
Margareth na entrega de quase um milhão de assinaturas, com outras entidades do Movimento Minha Vida Não Tem Preço, à Ministra Carmen Lúcia/STF.
O próximo vídeo, revela a verdade sobre a morte de Margareth. Cada vez que assisto, pulsa mais forte dentro mim o sentimento de revolta e choque da tamanha frieza e maldade.
FONTE: Movimento Minha Vida Não Tem Preço.
O que é HPN?
Hemoglobinúria paroxística noturna (HPN) é uma anemia hemolítica crônica adquirida rara, de curso clínico extremamente variável.
Hemoglobinúria - sangue na urina
Paroxística - eventualmente
Noturna - durante a noite
Urina escura (com presença de sangue) foi o primeiro sinal que caracterizou o nome dessa doença rara. Há também outros sintomas: fadiga extrema, anemia, tromboembolismo, dor abdominal, insuficiência renal e acidente vascular cerebral (AVC).
Saiba mais em: Hemoglobinúria paroxística noturna: da fisiopatologia ao tratamento.
- CASO DOS IRMÃOS, CONGO/PB
Na cidade do Congo-Paraíba, dois irmãos que tinham uma doença rara chamada Mucopolissacaridose tiveram desfecho negativo. Em outubro/2017, faleceu Matheus Queirós (23 anos) após complicações de saúde por ficar sem o medicamento que garantia sua qualidade de vida.
Não bastasse, na semana passada (08/11/18), seu irmão Lucas Queirós (26 anos) faleceu após dois anos sem tratamento. DOIS ANOS!!!!!!
Fonte: Associação dos Familiares, Amigos e Portadores de Doenças Graves (AFAG).
O que é MPS?
No paciente com MPS, os lisossomos não conseguem cumprir corretamente sua função. No caso desta doença, tais moléculas mal digeridas são os Glicosaminoglicanos (GAGs), responsáveis pela lubrificação e união entre os tecidos. Daí uma consistência mucoide, viscosa.
As GAGs se acumulam no lisossomo, fazendo as células crescerem. Outra parte é eliminada pela urina. Com isso ocorre o acumulo em órgãos como a pele, o fígado e o baço. Portanto, as MPS são também consideradas doenças de depósito lisossômico.
Há diversos tipos de Mucopolissacaridoses, que diferem de acordo com a enzima que está em falta do organismo do paciente.
Leia mais em: LUTO: jovem paraibano morre após passar dois anos sem medicação por ter tratamento interrompido pela Justiça, Paraíba Polêmica, 08/11/2018.
- CASO LAISSA SILVA, CAMPINA GRANDE/PB
Em agosto deste ano, fomos testemunhas do grito de VIDA da menina Laissa Silva, também conhecida como Laissa Guerreira.
Semanas depois da divulgação desse vídeo, a garota teve seu direito concedido novamente. Passou a receber o medicamento que melhora a qualidade de vida das crianças com Atrofia Muscular Espinhal (AME).
Laíssa foi um exemplo de garra e vitória. Infelizmente, nem todas as pessoas com doenças raras possuem final feliz como o dela.
FOTO: Desembargador revê decisão e concede medicamento a paraibana com doença rara", Paraíba Online, 22/08/2018.
O que é AME?
A atrofia muscular espinhal (AME) é uma doença genética rara que afeta as células nervosas da medula espinhal, responsáveis por transmitir os estímulos elétricos do cérebro até aos músculos, impedindo assim que a pessoa tenha dificuldade ou não consiga movimentar os músculos voluntariamente.
Existem vários tipos de atrofia muscular espinhal, dependendo do grau de comprometimento dos músculos e da idade em que surgem os primeiros sintomas.
Saiba mais em: O uso de fármacos no tratamento da atrofia muscular espinhal: uma revisão bibliográfica.
Abaixo, segue uma de nossas últimas manifestações que foi realizada na cidade do Rio de Janeiro (maio/2018) onde estiveram representantes de pacientes de todo país.
FONTE: Movimento "Minha Vida Não Tem Preço" que aconteceu na frente do espaço que ocorreu o Congresso Brasileiro de Genética Médica e II Encontro de Associações de Pacientes (maio/2018).
Margareth, Matheus, Lucas e Laissa... só mudam de endereço. Porém, todos vivenciaram a triste situação de ter seus direitos negados.
A garota Laissa Guerreira continua firme e cheia de histórias para contar. E nosso maior desejo é que muitas Laissas também recebam seu tratamento.
Centenas pessoas tiveram seus direitos negados.
Muitas famílias devastadas pela perda de uma pessoa amada.
Após muitas manifestações, lutas, diálogos e audiências públicas, tivemos poucos avanços.
Temos medo do amanhã. Quantos ainda perderam suas vidas?
Não desistiremos!
Nossa luta continua firme, divulgando as injustiças e crimes que vêm acontecendo com os Raros do Brasil.
Compartilhe a causa! Uma doença grave pode acometer qualquer um de nós.
#MargarethPresente #SomosTodosRaros
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Tenho 37 anos, enfermeira, consultora científica em doenças graves, pós-doutora em saúde pública e escritora. Nos comentários abaixo, deixe sua opinião sobre o texto.
Abraços!
Enfermeira I Clínica Médica I Clínica Cirúrgica I Pronto Atendimento Adulto e Infantil I Oncologia I UTI COVID. Pós - graduanda em Urgência e Emergência e Oncologia.
6 aGeisa, pouco conheço sobre Doenças Raras, achei muito interessante seu artigo, e fiquei realmente triste em saber que muitas pessoas precisam do Estado, para continuar tendo um dia a mais de vida e ao lado dos seus familiares. Isso realmente é vergonhoso, sabendo que os medicamentos existem, porém as políticas públicas não colaboram. Forte abraço, continue escrevendo e divulgando.
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6 aA mesma patologia da Laísa sendo que a minha é tipo 2 e o juiz interferiu na minha medicação alegando que eu tenho 22 anos e por conta disso a medicação não ia trazer resultado e hoje eu não tomo mais água líquida só com espessante e também não como mais alguns alimentos porque a doença tá piorando. Me chamo renally tenho 22 anos e moro em Campina Grande Paraíba.
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6 aGeisa Luz, fiquei sem palavras ao ler o seu artigo, senti tanta tristeza e ao mesmo tempo me senti tão pequena em relação a estes seres humanos que mesmo sofrendo com este cenário lamentável, ainda sim são tão fortes, tão grandes e generosos.
Vergonhoso esse quadro. Deve ser desesperador saber que os medicamentos estão tão perto e tão inacessível devido a ineficiência das políticas públicas de saúde.
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6 aMais que uma causa. Confesso ter ficado sem palavras aqui😪. Eu até participo de vários projetos sociais, mas ainda há tanto para ser feito em nosso país. Bom saber que existe você Geisa Luz.