A Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADIN 1931-8 e a polêmica sobre o dever de restituir

A Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADIN 1931-8 e a polêmica sobre o dever de restituir

Tão logo a Lei das Operadoras de Saúde passou a produzir seus efeitos, a Confederação Nacional de Saúde promoveu a Ação Direta de Inconstitucionalidade ADIN 1931-8, sendo iniciado o julgamento da medida cautelar em 20 de outubro de 1999, tendo como relator o Ministro Maurício Corrêa, findando em 21 de agosto de 2003.

Tinha-se como objetivo a suspensão de alguns artigos da Lei 9.656/98, bem como a declaração de inconstitucionalidade do artigo 32 da mencionada. O Supremo Tribunal Federal entendeu que alguns artigos deveriam ser suspensos, porém declarou constitucional a obrigação aludida no art. 32.

Alega-se que a inconstitucionalidade do artigo se dá em razão de alguns motivos principais, quais sejam:

  • A natureza tributária do artigo, que se declarada, seria inconstitucional por criação mediante lei ordinária;
  • A violação do princípio da universalidade em relação aos serviços públicos.

 

Dessa forma, sustenta-se a posição de que o ressarcimento ao SUS caracterizaria natureza tributária, a qual só pode ser instituída por meio de Lei Complementar, conforme preleciona art. 154 da Constituição Federal de 1988 em contraprestação à Seguridade Social predita no art. 195, da retrocitada Constituição, na qual a saúde é ínsita.

Ampara-se, também, sob o argumento de que os atendimentos prestados em âmbito do Sistema Único de Saúde são caracterizados pelo princípio da universalidade em relação aos serviços públicos, sendo este direito de todo cidadão, vez que também contribui junto a Seguridade Social, não havendo motivos para que a Operadora de saúde ressarcisse o sistema posteriormente.

Fato é que – ao fim do julgamento da cautelar – discorreu-se preliminarmente sobre a constitucionalidade do artigo.

Neste sentido, esclarece-se que o artigo 32 da Lei 9.656/98 não possui natureza tributária e sim indenizatória, vez que tributos são criados mediante Lei Complementar, não podendo suscitar também o caráter punitivo, porque não resta caracterizada qualquer infração ou ato ilícito quando o segurado utilizar o SUS, e a operadora ressarcir o atendimento financiado como se fosse uma multa. Logo, conclui-se que o caráter do ressarcimento é indenizatório, com vistas à prevenção do enriquecimento indevido das operadoras.

É mister dizer que até a presente data a ADIN 1931-8 não foi julgada, porém o assunto já caracterizou repercussão geral, conhecida pelo Supremo Tribunal Federal, com relatoria do Ministro Gilmar Mendes, mediante RE 597064, apresentando os mesmos pontos. O que as operadoras têm torcido é para que logo providencie-se o julgamento da ADIN, vez que a cada ano os valores a serem ressarcidos aumentam, o que, obviamente, é prejudicial ao sustento financeiro daquelas.

Qual a visão dos tribunais em âmbito do ressarcimento ao SUS?

Com a presença da ADIN 1931-8, as operadoras de saúde enxergaram uma oportunidade de contrapor a obrigação de ressarcir imposta com a chegada da Lei 9.656/98.

Diante disso, as operadoras contracenam desde a vigência da Lei um embate para o afastamento da obrigação do ressarcimento, e, para tanto, têm ingressado aos tribunais buscando a impugnação da imposição pelos motivos já aludidos. Ocorre que, conforme decidido preliminarmente em sede da ADIN 1931-8, ainda em âmbito de sua cautelar, o artigo 32 da Lei continua vigendo com o status ao qual foi editado, sendo então indiscutíveis as pretensões arguidas perante o judiciário no sentido da inconstitucionalidade, de modo que as operadoras sucumbem às decisões magistrais, principalmente pelo o que se constata junto ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região, que frequentemente tem decido a favor do ressarcimento, haja vista que o mesmo Tribunal editou a Súmula 51, na qual assevera preliminarmente a constitucionalidade do artigo, como também se observa nas decisões deliberadas pelo Superior Tribunal de Justiça[1].

Muitas dessas operadoras de saúde recorrem aos órgãos julgadores com intuito de que se reveja tal situação levantada em âmbito da cautelar, porém ao que se analisa dos julgados, não parece ser favorável suscitar a questão da constitucionalidade do dispositivo, haja vista que, até a presente data, a ADIN 1931-8 permanece qualquer sem previsão de julgamento.

Assim, atualmente resta devida toda cobrança encaminhada pela ANS em razão do ressarcimento, sob pena de inscrição de inadimplência, inscrição em dívida ativa e posterior execução judicial, onde, nesta oportunidade, diversas operadoras de saúde declaram "falência" pelos exorbitantes números a serem quitados, que, em muitos casos, ultrapassam a renda auferida com sua carteira de beneficiários.

Diante desta situação, gira uma polêmica enorme sobre o dever de restituir, tendo em vista que ao impor tal obrigação às operadoras, o Estado estaria descumprindo seu dever, bem como cobrando impostos indevidamente do sujeito que possui um plano de saúde privado, já que ao realizar tal pagamento, ele também teria o direito de ser atendido pelo sistema público sem que isso gerasse ônus posterior.

Ademais, além da tributação indevida, há alegações de que com tal postura o Estado também estaria enriquecendo indevidamente, vez que o indivíduo que mantém um plano de saúde privado paga também por seus impostos, e, caso, eventualmente, necessite de atendimento na rede financiada pelo SUS, a conta relativa a este seria repassada à operadora de saúde responsável por seu cadastro ativo, gerando um exorbitante lucro.

Destarte, é clara a querela instalada, a qual não cessará enquanto não se pronunciar definitivamente o STF, o que abre margem as inúmeras contestações dos "devedores", bem como dos pedidos de cobrança dos "credores", que travam o certame popularmente chamado de Ressarcimento ao SUS

 

[1] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Processual Civil. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1348899 RJ 2012/0214521-3, 1ª Turma. Relator: Ministro Benedito Gonçalves. Rio de Janeiro, RJ,  18 de nov. 2014;  BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Processual Civil e Administrativo. Agravo Regimental no Recurso Especial nº 399192 RJ 2013/0321099-7, 1ª Turma. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Rio de Janeiro, RJ, 27 de mar. 2014.

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